quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Balancê

O ano das pequenas coisas. Começar por olhar para as estrelas com outros olhos. Passar do sol que se põe todos os dias para um pôr-do-sol. Depois para o frio que gela a ponta do nariz e enruga os lábios. Os raios de sol que atravessam à força as nuvens. As mãos unidas, uma com força. As sombras. A espuma no mar, a marca das ondas na areia.

Os teus olhos a olharem para tudo.

Uma bolacha partida. O resto do vinho tinto que de manhã se deita no lava-loiça e que faz uma cor extraordinária. A flor seca que se apanha e se guarda. A pena que marca o livro. O jeito que temos de sorrir, de mexer os braços quando falamos. A cova que tens geometricamente posicionada por baixo do teu lábio. Os dois brincos de prata. As minhas unhas roídas, junto à cicatriz da vez em que deixei os dedos presos na tomada da electricidade ao desligar a consola.

Os teus olhos a fitarem-me as mãos.

Uma pedra em forma de peixe balão. Um coral com cheiro a mar, que orgulhosamente se mostra a quem visita a casa e diz: "Foi uma prenda! Cheira lá!". As fotos. As palhas que flutuam na piscina. A pinha. As pedras. As amígdalas com muitos pontinhos brancos. O baloiço. Os lençóis. A almofada. O Joey, com linhas azuis. O cofre. A escova de dentes na casa-de-banho. O descascador de legumes. O comboio a passar pela Meia-Praia e a chegar a Lagos à meia-noite. Os corações de papel. Os canos rotos, que faziam escorrer água pela entrada do prédio e pela minha face abaixo. As cores das velas. Das pétalas. A lua. A lua! O J&B. O "?".

Os meus olhos a não descolarem dos teus.

E os outros. Todos os outros. Os olhares tristes. Os suspiros. Os sorrisos. Os abraços prolongados de "obrigado". A cartolina preta com um furinho. "Viva La Vynil!". As gargalhadas estridentes. Os parafusos a serem apertados. O silêncio de um carro. As testas coçadas, com os olhos fechados. O fumo dos cigarros. O sal dos amendoins do Mané. O primeiro pôr-do-sol em Berlim. O vento na cara a andar de bicicleta. Os patos em Amesterdão. As paredes das coffee shops. As viagens de metro em Londres. O vinho chileno no jantar com vista para Hyde Park. Os telemóveis, que ora ajudam, ora estragam tudo.

Dois mil e oito foi um ano de pequenas coisas que todas juntas ajudaram a fazer o melhor ano da minha vida. Agora ele chega ao fim. E vai começar de forma diferente, desde logo. Em mim deixa saudades, porque queria que fosse sempre assim. Digo-o com espírito derrotista. Porque foram precisos 26 anos para poder dizer isto, caraças! Será que vai voltar a ser o que era?


Feliz Ano Novo.

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